quarta-feira, 25 de junho de 2008

Chuva



Chuva


Hoje está fazendo muito frio

Mais um dia de trampo

Moro em Hortolândia, trampo em Campinas

Lá vou eu, pego a lotação e observo o moço que sempre é gentil, oferece o lugar para mulher grávida, as vezes ele fica estudando...

O meu amigo motorista corre e corre para fazer o mesmo caminho...

Entre solavancos e brecadas lá vamos nós, pessoas e pessoas indo trabalhar, ainda bem!

Em um dos solavancos, quase caímos...normal, é assim mesmo!E nos equilibramos, e se caimos levantamos e assim é a vida!Caiu? Ergue a espinha e levanta!

Desce de uma lotação e entra na outra...

Pessoas, sacolas, mulher, homem,criança, tudo ali...tudo ali...,vamos trampar!

Chego, alegre meu trampo é sagrado, Hj é dia de dar aula na casa de Ana, uma mulher de garra!

Aprendo muito com suas histórias...e é assim...durante a semana toda, lecionando de casa em casa ou de apartamento a apartamento, rs, nomade!

No almoço, levei um pão com salsicha, adouro!Dulce também trampa na casa, como eu

Dulce me mira e diz:¨- Vai um ovinho aí, no meio desse pão?Valeu Dulce!

Termino meu pãozinho e vou pegar o busão!

No ponto de ônibus faço amizade com uma senhora simpática, vai logo sorrindo e hablando...

Lá vou eu..., estou no centro da cidade, adouro o fervo da 13 de maio em Campinas, caminho por essa rua desde pequenina, desde os 12 anos solita e amo!

Mirar as pessoas, as vezes ouço parte das histórias, é legal!

Fizemos várias intervenções artísticas psicodélicas, lá...

Começa a chover e vou caminhando pela Glicério, pessoas apressadas..., pessoas no chão encostadas nos muros,pessoas tremem enroladas em cobertores finos...

Penso nas pessoas...nesse frio, as crianças perto da igreja do Carmo, dormindo no chão molhado...

Ninguém vê...

De madrugada os moços e moças da Toca de Assis recolhem alguns...algumas pessoas levam sopa...algumas...

Corro...o tempo descontrolado se vai...e chove mais forte!

Resolvo esfriar a cabeça, vou tomar sorvete...o agora é importante!, não tem aquela personagem da Virginia Woolf que compra suas flores..., então compro a minha rosa branca e tomo meu sorvete!

Tomo o sorvete feliz, me equilibrando com o guarda- chuva e a rosa branca.

O guarda- chuva virando para cima e eu empurrando para baixo!

Miro, as pessoas e suas moedas...pedindo e pedindo...

Miro os pastores que gritam e gritam pela praça...

Entro na igreja, vou direto ao altar de Maria, coloco a rosa branca para ela...peço, agradeço...

Vou embora pela 13 de Maio...subindo a ladeira, e miro aquele corredor colorido sem fim...de pessoas...

Pego a lotação..., as mesmas pessoas entram vendendo...e contando suas histórias...que já decorei...

Uma pequenina linda de gorrinho colorido entra mira a todos e sorri...mira e fala:- ¨Oiiiiiiiii!¨

Começo a sorrir vendo ela tão linda...

A mãe entra e conta que a pequenina tem leucemia, mostra o documento da Unicamp...precisa de ajuda..., ajuda...

Conta que a pequenina perdeu sua boneca no outro ônibus...

Miro as pessoas, algumas se emocionam.Eu? coração tum-tum..., fico mirando a pequenina...pensando no que meu amigo me ensinou...se esmola ajudasse...mas não é assim que se transforma...

Sim, eu o compreendo

A pequenina toda feliz com seu gorro colorido sorri..., não sabe da vida.. perdeu sua boneca...

Quando dei aula em Hortolândia, os alunos podiam receber 2 bolachas e uma caneca de leite

Falavam:¨-Tia dá mais uma bolacha?¨, claro que dava...,coração desobediente o meu!

Minha mãe também foi professora e contava histórias incríveis...de fome e violência, reais, ela era uma guerreira...um espelho!

Chego em casa...ai que frio...banho ,pijamão nada sexy, coloco calça, camisolão e blusa de frio, duas meias ,tomo minha sopinha deliciosa,como pão, chocolate!

Vou ao computador hablo poquito, e vou para debaixo da coberta, leio um pouco de Amor Líquido, ( ganhei de aniversário de Márcia, gracias!) maravilhoso livro...e naninha!
Lú- artista, Lú- mulher, Lú- que trampa...é isso aí!
Corpo- trampo, corpo- mulher, corpo- feliz!



Luciana Pontes
*Amor Líquido- Zygmunt Bauman, Editora Zahar.Fala sobre a fragilidade dos laços humanos





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